22 de Outubro de 2012
47 – DÚVIDAS DE CORAGEM
O fundo do lago ganha
cores sombrias à medida que Renato e João Miguel nadam para longe. Dom Raimundo
deu ordens para que os polvos e os chocos pintassem as águas de negro. O grande
jacaré não quer ser visto por ninguém. Acaba de ser enganado por uma criança e
por um sapo minúsculo, e não quer que ninguém o saiba.
- Temos de regressar a
Okatonga, João Miguel. Vamos nadar depressa para bem longe daqui antes que o
jacaré resolva vir atrás de nós.
O menino nada enquanto
pensa em libertar os reis Alberto e Alberta. A sua valentia pode não ser
suficiente para cumprir tão importante missão.
- Achas que vou ser
capaz de libertar os reis do vosso reino, Renato? – pergunta o menino com inquietude.
– Estou a ter dificuldades em respirar. Temos de regressar rapidamente à
superfície. A poção deve estar a deixar de fazer efeito.
O sapo faz um derradeiro
esforço e nada como nunca. O lago está escuro. As suas águas estão a ficar
turvas, muito negras, pois os cefalópodes cumprem à risca as ordens de Dom
Raimundo.
- Estou a ficar cansado,
Renato. Ainda faltará muito para chegarmos à superfície? – pergunta João Miguel
com os olhos quase fechados.
O sapo agarra a mão
direita do menino e dá grandes impulsos com as potentes patas para chegarem à
tona de água. Assim que o rapaz coloca a cabeça de fora do lago, enche os
pulmões com uma grande golfada de ar puro. Sente, de imediato, um grande
alívio.
Renato conseguiu
trazê-lo até aqui, são e salvo.
O sapo conseguiu
atravessar o coração do grande bosque chuvoso, e sair de uma das zonas mais
inóspitas e esquecidas de Okatonga, por onde só Belchior se aventura.
O sapo conseguiu
libertar João Miguel da boca sombria do velho jacaré e conseguiu trazê-lo até
aqui, são e salvo.
As águas límpidas do
lago estão todas negras, carregadas de uma tinta escura lançada pelos milhares
de polvos e chocos, vassalos de Dom Raimundo.
- Vem, João Miguel, só
mais um esforço! Temos de chegar aquela pequena enseada antes que a tinta
espessa nos dificulte os movimentos.
As últimas braçadas são
dadas com grande dificuldade e sofrimento. A fuga debaixo de água foi fatigante
e os últimos metros até chegada a terra firme custam imenso a passar.
Renato chega primeiro, o
João Miguel logo a seguir.
Exausto, o menino
deixa-se cair de costas. Fica de braços e pernas abertos a contemplar o céu.
O grande lago é uma
imensa mancha de águas negras que se estende até onde a vista alcança. Renato
segura na mala do menino, levanta-lhe a cabeça com delicadeza, e coloca-a
debaixo da nuca a servir-lhe de almofada.
- Chegámos, João Maria. Foi
por um triz que conseguimos nadar até à costa. Descansa um pouco, recupera as
tuas forças que ainda temos um longo caminho a percorrer.
O menino olha para o
céu, espera por uma resposta escrita nas nuvens. Gostava que elas lhe pudessem
enviar uma mensagem, gostava que lhe dissessem como deve proceder para
conseguir libertar os reis de Okatonga.
- Renato, o que devo
fazer para libertar os reis Alberto e Alberta? És capaz de me dizer, Renato, o
que vou fazer para cumprir com êxito a minha missão.
O sapo colocou-se ao
lado do menino e responde:
- Tens de acreditar em
ti, como todos nós acreditamos! Okatonga depende de ti para continuar a
existir. Tu és o menino mais valente de todo o mundo, e agora que já és
aprendiz de alquimista, nada nem ninguém te poderá vencer. A única coisa que
tens de fazer é acreditar em ti, acreditar nessa força invisível que te
pertence. Recorda o lugar onde a arquivaste, relembra as outras vezes em que
lhe deste uso, mesmo que julgues nunca a teres utilizado. Só tu podes responder
à pergunta que acabas de colocar.
- Tinhas razão Renato, o
Belchior não é de confiança. Em Okatonga, há muitas coisas que não são aquilo que
parecem. Temos de sair daqui. Se o coelho é um espião, mentiu-nos quando disse que
Dona Suzete foi derrotada e ficou com uma pata ferida. Ela deve estar por perto,
não sei porquê, mas acho que a grande aranha branca deve estar quase a encontrar-nos.
Os olhos vermelhos do sapo
Renato voltam a faiscar como quando estavam dentro da boca de Dom Raimundo.
- AI MINHA RICA MÃEZINHA!
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