06 de Julho de 2012
32 – AI, QUEM ME ACODE?
A casa de Zebedeu não é uma casa como as outras. Está
dissimulada numa das regiões mais inóspitas de Okatonga, bem no interior da
floresta labiríntica. Quem o tenta descobrir, acaba por desistir. Dias houve,
logo após o seu desaparecimento, em que mais de mil visitantes se aventuraram
na tentativa de encontrar o seu refúgio. A maioria acabou por desaparecer, e
outros voltavam, completamente exaustos, ao fim de alguns dias, sedentos e
esfomeados.
O João Miguel é a primeira visita que o anão recebe em
sua casa. Se alguma coisa lhe acontecer, a floresta desaparecerá, e com ela a
cidadela e todos os seus habitantes. Zebedeu é o único habitante que tem
conhecimento desta situação. Ele tem de continuar a ajudá-lo pois é ao menino
que se deve a existência do reino de Okatonga. Os animais que vivem na floresta
andam agitados e irritadiços, pressentem que alguma desgraça pode estar para
acontecer. O alquimista sabe o que tem de fazer para que o pior não suceda.
João Miguel e Zebedeu comeram duas fatias do bolo de
chocolate.
O anão corta outra fatia generosa de bolo.
- Toma! Não tenhas medo de engordar que o meu bolo não
engorda. Descobri ingredientes espantosos, que adicionei à receita, para evitar
que isso aconteça. É uma poção muito simples, sem cheiro e sem sabor. Podias
comer cinquenta destes bolos que não engordarias um único grama.
- Uma poção que não deixa ninguém engordar, mesmo se
comer muito? Deve ser muito valiosa! – diz o menino, com espanto.
- Todas as minhas poções são valiosas, até as menos
relevantes, como, por exemplo, aquela que eu uso todos os dias para não ter de
tomar banho. Basta usar duas gotas do meu bálsamo “higienicus”, e o seu efeito
é igual ao de um banho perfumado de duas horas. Assim economizo tempo para o
meu trabalho de investigação, que é bem mais importante!
João Miguel fica muito curioso com as palavras de
Zebedeu. Onde ficará esse tal laboratório secreto? Deve ser enorme e deve estar
cheio de misteriosos ingredientes e de frascos coloridos. A vontade em vê-lo
começa a fazer-lhe cócegas na língua.
- Tu tens um laboratório onde fabricas os bálsamos,
cremes e poções, não é verdade? Deve ser maravilhoso! Eu gostava tanto que me
mostrasses o lugar onde trabalhas. Posso ver o teu laboratório, Zebedeu?
O alquimista estava à espera da pergunta. Foi para
isso que o menino se aventurou pela floresta, e tem de ser recompensado.
- Sim, eu mostro-te esse lugar que todos gostariam de visitar.
Mas aviso-te que vais ficar desapontado. O “laboratório” não é comparável
àquilo que estás a pensar, mas para mim, é mais que perfeito! – diz Zebedeu.
- Como sabes o que estou a pensar? Também consegues
ler pensamentos?
O alquimista não responde, salta da cadeira com
agilidade, e monta a bicicleta que estava esquecida no chão, junto à perna da
mesa.
- Anda, segue-me, se fores capaz! – diz a pedalar
velozmente ao redor da mesa, dando três voltas completas antes de desaparecer
pela porta entreaberta.
O João Miguel tarda em reagir.
Zebedeu sai do salão quando ele ainda se entretém com uma
fatia do seu bolo favorito.
Os dedos, o queixo, os lábios e os cantos da boca
estão pintados de chocolate. O menino salta da cadeira e começa a correr em sua
perseguição.
- SOCORRO! SOCORRO! ALGUÉM ME ACUDA! SOCORRO! SOCORRO!
QUEM ME PODE AJUDAR? AJUDEM-ME, POR FAVOR, AJUDEM-ME QUE ESTOU PRESO! SOCORRO!
AJUDEM-ME! HAJA ALGUÉM QUE ME AJUDE! – ouve-se uma voz rouca e aflita que soa
de uma das janelas fechadas do salão. – SOCORRO, POR FAVOR, VENHAM ACUDIR-ME
SENÃO MORRO! AI MINHA MÃEZINHA, QUE NUNCA FIZ MAL A NINGUÉM! ACUUUUUDAM-ME! –
repete a voz rouca e cansada, em grande aflição.
O João Miguel hesita! Quer ir ter com Zebedeu para
visitar o laboratório. Foi para isso que aqui se deslocou, mas não pode deixar
de escutar esta prece. Alguém está aflito e necessita de auxílio.
Olha uma última vez para a porta por onde o anão
seguiu antes de voltar atrás. Vai até junto da janela onde escuta a voz. Quem poderá
ser? Zebedeu vive sozinho, não recebe visitas e não gosta de ser incomodado por
ninguém, ou será que é mentiroso?
A janela é alta e o menino não consegue lá chegar. Os gritos
continuam, e ele usa a maior das cadeiras como escadote para poder trepar. Abre
a portada da janela e fica espantadíssimo com o que os seus olhos veem. Do lado
de lá das sujas vidraças, está o sapo Renato atado à volta de um grosso tronco de
árvore. Um dos seus ramos encontra-se à distância de um simples salto e a tarefa
de salvação está nas mãos do menino investigador.
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