sexta-feira, 27 de abril de 2012

ESQUECIMENTO


22 de Abril de 2012


5 – ESQUECIMENTO


As árvores, mais altas do que alguns prédios, tocam-se nas copas protegendo o interior da floresta. Passaram a ser a única companhia do João Miguel, juntamente com a lua e as estrelas.
A caixa branca está enfeitada com uma bonita fita da mesma cor, atada num laço que suspira pelos dedos finos do menino. O que será que os sapos lhe trouxeram de presente? O que será que esconde a escura floresta?
- Tenho de ganhar coragem e avançar pela passadeira brilhante de relva que os sapos me estenderam. É melhor aproveitar. Quem sabe se não será esta a única maneira de conseguir chegar ao interior de Okatonga.
E sem mais demora, o João Miguel seguiu pela passadeira verde que se encontrava impecavelmente aparada. Mal deu os primeiros passos dentro da floresta, um silêncio raro tomou conta de si e a passadeira começou a encolher, começou a ficar cada vez mais estreita, tão estreita como a largura dos seus pés.
- Oh! Que cabeça a minha! Esqueci-me do presente! Tenho de voltar atrás... Como foi possível esquecer-me do presente?
Quando se virou para regressar, o tapete verde encolheu ainda mais, encolheu tanto que só restava uma finíssima e brilhante risca verde que ele seguiu sempre a correr. Ao fazê-lo, perdeu os confortáveis chinelos de peluche. Não abrandou. Chegou ao ponto de partida no exato momento em que a risca de verde desapareceu por completo. Está cansado pela corrida, assustado com o desaparecimento da estrada de relva e triste por ter deixado os seus chinelos favoritos algures na floresta. O João Miguel começa a duvidar se esta será, de verdade, a floresta da história da mãe. A primeira excursão por Okatonga não correu nada bem. A floresta é escura, imponente, silenciosa e parece não gostar de intrusos. E o que terá feito desaparecer a bela estrada de relva? Se não se tivesse esquecido do presente, não teria regressado e estaria agora perdido no interior de Okatonga, no escuro, no meio daquele silêncio e de madrugada. Isso não seria lá muito bonito!
- Bolas! Mas que chatice! Estou descalço. Assim não vou conseguir explorar a grande floresta. Sem chinelos, nada feito! É tão escura e tão silenciosa, e não é nada simpática.
O João Miguel tinha-se cortado, sem perceber, numa das muitas silvas que pisou ao regressar. Duas gotas de sangue caem em cima do presente branco que ainda permanece por abrir.
Cansado, o menino acaba por adormecer junto à caixa branca recordando os confortáveis chinelos de peluche.

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