27 de Abril de 2012
7 – ESMERALDA
Belchior é um coelho veloz.
Salta com tanta rapidez que o João Miguel acaba por
perdê-lo de vista. Estar descalço também não ajuda. A floresta, afinal, é
húmida e sombria, é desconfortável e até um pouco assustadora. Mas o menino não
desiste. Escuta os barulhos que Belchior faz ao penetrar na floresta, segue as
marcas de ramos quebrados e folhagens pisadas e descobre os lugares por onde
ele passou. Continua corajoso a desvendar o caminho. O pior de tudo, são os
seus pés. Estão feridos e não consegue correr. Decide abrandar o ritmo da
perseguição e para junto a um velho pedaço de tronco abandonado. Sentado, olha
para as calças de pijama rasgadas e para os pés maltratados.
- Bolas! Mas que coelho maluco! Convidou-me para o
seguir e depois fugiu sem me dar qualquer pista. E acabei de estragar o pijama
que a avó Dulce me ofereceu. Vai ficar muito zangada. Doem-me os pés. Seria bom
encontrar um pouco de água para os lavar.
- Porque não abres o presente? – pergunta alguém com uma
voz que se escuta junto a uma imensa sequoia. – Vá lá, abre o presente! Não
tens curiosidade em saber o que os sapos te ofereceram?
O menino roda a cabeça em todas as direções, tentando
descobrir a dona desta voz. Levanta-se, dá quatro passos em frente, olha para a
grande árvore, olha para cima e para baixo, olha junto ao solo, olha por detrás
dela, olha para dentro dela, olha, volta a olhar e… nada!
- Anda lá, vem abrir o teu presente! Quero saber o que
te ofereceram os sapos.
O João Miguel volta para junto da caixa branca. Ao
lado dela está uma menina muito pequena, tão pequena que a cabeça não chega
sequer à tampa do presente. Ela mexe na caixa, bate-lhe com as mãos minúsculas,
procura por ruídos que possam dar pistas sobre o que ali se esconde.
- Tu sabes o que está dentro da caixa? Deve ser coisa
importante! Já viste bem o tamanho do presente?
O João Miguel continuava admirado com a minúscula
menina. Nunca tinha visto nada assim. O seu corpo é pequeno mas as proporções
são as corretas. Não é uma menina anã, é uma menina como ele só que muitíssimo
mais pequena.
Olá, eu sou o João Miguel! E tu? Como te chamas?
A menina responde enquanto empurra a caixa do
presente.
- Chamo-me Esmeralda! Gostava mesmo muito que tu abrisses
a prenda. Sou curiosa e fico irritada, mesmo muito irritada quando não me fazem
as vontades. Se queres a minha ajuda, tens de abrir o presente. E despacha-te
que eu tenho outras coisas para fazer!
As mãos do menino começaram a desfazer o grande
laçarote branco que enfeitava a caixa da mesma cor. Esmeralda dá conta das duas
marcas vermelhas que estão pintadas na tampa do presente.
- Olha! Alguém se magoou? Estão aqui marcas de sangue.
Não gosto nada disto, é mau sinal. Na nossa floresta vivem seres que não podem
cheirar sangue, principalmente se for de noite. São perigosos e devemos ter o
máximo cuidado! Deves ser muito corajoso para passeares por aqui, e ainda por
cima sozinho.
O João Miguel responde calmamente:
- Eu não estava sozinho. Um coelho chamado Belchior
acordou-me com uma estranha canção. Disse que a gruta podia desabar e fez-me sinais
para eu o seguir. Consegui acompanhá-lo nos primeiros quilómetros, mas depois
foi mais difícil. Ele salta muito depressa, os pés começaram-me a doer e parei
para descansar. Foi assim que aqui cheguei.
Os olhos da menina brilham ao escutar estas palavras.
- Tu não me digas que vieste atrás do coelho Belchior?
A sério? Mas que menino corajoso! Agora CHEGA DE CONVERSA! Abre o presente, vá!
Abre o presente dos soldados sapo!
E o João Miguel, que já tinha desfeito o laço, abriu a
tampa. Levantou a caixa e olhou para o seu interior.
- Então? O que é que está aí dentro? – pergunta a
irrequieta Esmeralda.
Nas mãos do menino estão umas botas militares bem
engraxadas, negras, robustas, de solas grossas com um cano alto, em couro,
atravessado por fortes atacadores. As botas têm um aspeto muito resistente.
Esmeralda começa a rir à gargalhada assim que as botas
foram tiradas da embalagem.
- HA, HA, HA, que engraçado!! Mas que engraçado! Isto
tem realmente muita graça!
João Miguel não entende o motivo da risota.
- O que foi? São apenas umas botas da tropa. É por
isto que tanto te ris?
E Esmeralda explica:
- Claro! Tem muita piada! Então não percebes que
andaste este tempo todo a correr descalço pela floresta, a ferir os pés, as
canelas e os joelhos, a perseguir o Belchior feito um doido, e tinhas este
presente debaixo do braço? Um presente que, sem motivo, tu ainda não tinhas
aberto. Um presente que, afinal, te tinha sido útil na perseguição. É de morrer
a rir!! Não achas?
O João Miguel acabou por dar razão a Esmeralda e os
dois riem-se da situação.
- Tens razão. Não sei porque não abri logo o presente,
eu que sou tão curioso. Lembro-me que estava cansado e adormeci sem o abrir.
Quando acordei, tinha o Belchior aos berros perto de mim. Só tive tempo de
agarrar a caixa e correr atrás dele. Mas agora as botas vão ser muito úteis
para explorar os segredos de Okatonga.
E sem perderem tempo, a Esmeralda ajuda o João Miguel
a calçá-las e a dar dois nós bem apertados com os resistentes atacadores.
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