sexta-feira, 18 de maio de 2012

MISSÃO DE RESGATE



18 de Maio de 2012

13 – MISSÃO DE RESGATE


O gato vai gritando bem alto junto à saída do longo corredor. Vai dando indicações ao João Miguel que fica mais tranquilo por saber que o Sarmento está ali para o ajudar.
- Vem por aqui! Segue a minha voz sem receios. Deves estar bem perto da saída. Habitua-te à luz e não corras até voltares a ver bem todas as coisas.
A voz do Sarmento e a luminosidade exterior tornam-se cada vez mais fortes e indicam a proximidade da saída do imenso túnel.
É grande a surpresa do menino ao descobrir o gato-guarda. Sarmento tem um ar bem mais assustador do que da primeira vez que se encontraram. O João Miguel encolheu, ficou muito mais pequeno e o felino ganhou imponência e impõe muito respeito. Mas o que mais o impressiona são as suas grandes patas, com garras afiadas como punhais, que o gato vai raspando na lança enquanto olha para o João Miguel.
O gato olha para ele e ele para o gato.
Ninguém fala, ninguém se mexe.
Ao fundo, atrás do menino, vindo do interior do comprido túnel, ouve-se um barulho irritante como se dezenas de milhares de palitos estivessem a bater no chão do corredor de forma alternada e ritmada.
O Sarmento coça a barriga redonda e pergunta:
- Sabes, meu rapaz, quem provoca estes ruídos que crescem no interior do corredor por onde escapaste?
O menino não faz a mais pequena ideia e responde com voz inocente:
- Não, não sei! Mas agora que escuto com mais atenção, fazem-me lembrar os sons das cascavéis quando assinalam a sua presença.
Sarmento ganha um ar ainda mais solene, retorce os bigodes com a pata esquerda e informa:
- Não são cobras, mas também podiam ser …, são escaravelhos esfomeados à procura de alimento e a avançar unidos como um pelotão de combate preparado para guerrear. É melhor fugirmos daqui! Salta para as minhas costas antes que os insetos nos descubram.
Com uma grande destreza, o João Miguel sobe para o confortável dorso do gato Sarmento desejando que aquele exército rastejante não os alcance. Segura-se ao pescoço do gato-guarda como um valente cavaleiro e desaparecem no interior da floresta de Okatonga num passo muito apressado.
Mal o felino ganha maior velocidade, o menino lembra-se de Esmeralda. Afinal de contas, ela ainda está dentro do túnel que acabou de ser invadido por escaravelhos esfomeados e repugnantes. A sua amiga corre perigo e ele tem de fazer alguma coisa para a ajudar.
- Para, Sarmento! Para! Temos de regressar. A Esmeralda ficou sozinha no corredor e, a ser verdade o que me disseste, devemos voltar atrás para a defender.
O gato não lhe dá nenhuma atenção e continua a correr pelo interior da floresta. O menino fica impaciente e insiste:
- Ouviste o que te pedi Sarmento? Para! Para imediatamente! Precisamos de regressar para ajudar Esmeralda. Os escaravelhos esfomeados são insetos muito perigosos. Ela precisa da nossa proteção! – mas o felino corre ainda mais depressa depois do novo apelo do João Miguel, que não se deixa derrotar e insiste:
- PARA! PARA DE CORRER Ó GATO MALUCO!! A ESMERALDA CORRE PERIGO DE VIDA E NÓS TEMOS DE A IR SALVAR!
De nada servem as palavras fornecidas aos berros junto às orelhas do animal. O Sarmento parece que foi picado por abelhas furiosas e continua a correr a uma velocidade estonteante.
Com uma coragem do tamanho do mundo, o menino resolve largar o pescoço do gato e salta do alto das suas costas de olhos fechados. Voa, projetado pelos ares, ao longo de alguns metros e acaba por cair numa pequena e entufada elevação de terreno, sem se magoar. O gato Sarmento não dá conta da situação e desaparece pelo meio do arvoredo.
O João Miguel está de novo sozinho, mas agora tem uma missão a cumprir. Deve regressar o quanto antes ao corredor escuro para salvar a Esmeralda dos famintos escaravelhos. A queda acrescentou mais medalhas esburacadas às calças de pijama que a avó Dulce lhe ofereceu.
São muitas as marcas deixadas pelas passadas do Sarmento e dão pistas suficientes para o menino saber o caminho que tem de seguir.
As árvores, as flores, os galhos, as pedras e os muitos troncos velhos que por ali se encontram espalhados são colossais. Para o João Miguel todas as coisas ficaram bem mais crescidas. Mas não será por este motivo que ele desistirá. Não será por isto que Esmeralda deixará de contar com a sua ajuda.
O menino do pijama e das botas negras corre agora bem mais depressa do que correu quando perseguiu Belchior pela segunda vez. Corre como o vento, corre como os ciclones, corre como os furacões, corre tão depressa que num instante volta a encontrar a entrada do túnel de onde há bem pouco acabara de sair.
Antes de entrar, inclina a cabeça para a esquerda e coloca o ouvido em posição. Desta vez não escuta nenhum barulho. O silêncio reina no interior da escuridão.
- Vou entrar, está decidido! Foi por isso que regressei! – e sem ponta de medo o valente João Miguel desaparece no escuro corredor com grande rapidez. As botas negras são muito confortáveis e ótimas para cumprir a missão. Apesar de sentir saudades dos seus chinelos, sabe-lhe bem poder contar com estas novas aliadas, principalmente se algum desses insetos rastejantes o desejar atacar.
O escuro e a humidade fazem-lhe companhia na zona mais apertada do túnel. Depois disto, como recorda, surgirão vinte degraus e o corredor ganhará luz. Em seguida terá de continuar a subir bastantes metros até tudo se tornar bem menos íngreme a estrangulado, até que num lugar muito próximo da habitação tudo se alargará num pequeno hall onde se encontra a porta de entrada, ou de saída, conforme ali se chegue ou dali se abale.
E dos barulhos, nenhum sinal.
João Miguel sobe agora as escadas que o levam até onde o corredor se ilumina. Avança, sempre a subir, e a subir, e a subir… até que o túnel deixa de ser íngreme e volta a ser sereno.
E dos barulhos, nenhum sinal.
Continua, em passos mais ligeiros, pela parte mais larga do imenso corredor. Vê a porta, lá ao fundo, a mesma por onde Esmeralda o puxou por um braço.
E dos barulhos, nenhum sinal.
Corre estes últimos metros tão depressa que quase tomba.
Chega cansado à grande porta e antes de rodar a bonita maçaneta de cobre volta a escutar estranhos barulhos que soam por detrás dela.
Os ruídos irritantes, alternados e ritmados são agora acompanhados por um outro barulho martelado e compassado, muito mais forte, que a eles se sobrepõe.
De vez em quando, escutam-se também guinchos agudos que saem por debaixo da fresta da velha porta de carvalho que lhe falta atravessar.


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