6 de Dezembro de 2012
59 – OS REIS CARACOL
Os reis de Okatonga são
dois grandes caracóis de olhos azuis cintilantes e magníficas conchas rosadas.
A prisão é um cubo de
vidro que está montado no salão mesmo por baixo do sistema luminoso do farol.
Duas coroas douradas
embelezam as reais cabeças, que sorriem satisfeitas.
O farol parou de girar
quando o João Miguel pisou o ducentésimo vigésimo segundo degrau da grande
escadaria de pedra.
Três gotas minúsculas
de tinta encarnada mantiveram-se agarradas à colossal parede branca do farol.
Foram as únicas marcas sobreviventes das listas vermelhas que o decoravam.
A rainha Alberta desce
do trono de prata e aproxima-se da parede envidraçada por onde o menino os
observa.
- Olá, João Miguel! Foi
por muito pouco que Okatonga não desapareceu para sempre nos túneis do
esquecimento. Três gotas de tinta da cor do sangue impediram que tal tivesse
acontecido, e a tua coragem salvou-nos a todos. Temos uma dívida de gratidão
eterna para contigo. Sabemos que o anão Zebedeu te acolheu no lugar secreto
onde se esconde. Algumas peripécias da tua aventura foram-nos contadas por guerreiros de Dona Beatriz, a quem também tanto devemos. Mestre Tino
não te conseguiu prender! Agora, que conseguiste ultrapassar o derradeiro
desafio, a tempestade vai acalmar, a cidadela deixará de se enervar, e a
floresta abrirá de novo o seu coração a todos os que a desejem visitar.
O menino pega no pau de
giz e tenta desenhar, sem êxito, uma circunferência na parede de vidro. A
abertura circular não se forma, e os reis continuam presos dentro da cela
transparente.
As nuvens escuras dão
lugar a um bonito céu azul de fim de tarde.
- E agora? – pergunta o
João Miguel à rainha caracol – como vos posso ajudar a sair desta prisão?
O rei Alberto desce do
trono de prata e avança até à parede de vidro por onde o menino os espreita.
- És um valente, meu
rapaz! Um verdadeiro valente! A tua façanha é digna de um herói! O alquimista
deve estar orgulhoso de te ter como seu aprendiz. Mas falta, ainda, um pequeno
detalhe na história. Terás de te encontrar com Mestre Tino, para que ele te
entregue as chaves do nosso cárcere. O buldogue ditador perdeu o jogo, e já
deve estar lá em baixo à tua espera com as chaves entre os dentes. Vai ter com
ele, mas não desças as escadas a correr, pois tens do teu lado todo o tempo do
mundo. Faz como nós, avança devagar, mas chega sempre onde tens de chegar. Se
assim o fizeres, serás o mais rápido de todos. É por esse motivo que nós somos
os reis de Okatonga!
João Miguel fica
contente com as palavras do rei Alberto. Vira-se, e desce as escadas sem
grandes pressas. Delicia-se a contar, novamente, os duzentos e vinte e dois
degraus feitos de pedra. A aventura desfila na sua memória enquanto faz a
contagem. Ao pisar o último degrau, sai pela abertura circular desenhada na
porta de madeira, que já ganhou uma fechadura e um bonito batente de bronze em
forma de tartaruga.
Mestre Tino está à
entrada do farol de olhos entristecidos, com um conjunto de chaves douradas
agarrada com firmeza pelas fortes mandíbulas.
Ao longe, correndo pela
longa alameda do jardim, chegam os ministros do buldogue, acompanhados pela
terrível aranha Susete. Atrás deles, acabado de sair das águas do lago
octogonal, caminha o velho Dom Raimundo a um ritmo moderado.
O grande cão ditador tem
a caixa de escaravelhos fechada à sua frente, perto das patas.
Aparecem Aroma e Amora,
e colocam-se ao lado direito de Tino, com a raposa Judite e o porco Baltasar. O
gato Medina esgueira-se para o lado direito do cão, tal como o macaco Isidoro,
o sargento-sapo, o coelho Belchior e a aranha Susete. Apenas falta Dom
Raimundo, que já sobe as escadas de acesso à porta do farol onde todos se
encontram reunidos. O velho jacaré escolhe o lado direito do buldogue, perto de
Baltasar, para terminar a marcha, e é então que Belchior começa a cantar:
- Um, dois, três, quatro, os animais reunidos
Cinco, seis, sete, oito, estão muito arrependidos
Nove, dez, onze, doze, mil perdões te são devidos
Um, dois, três, quatro, és um grande campeão
Cinco, seis, sete, oito, venceste a competição
Nove, dez, onze, doze, cumpriste com a missão
Um, dois, três, quatro, com enorme valentia
Cinco, seis, sete, oito, fosse de noite ou de dia
Nove, dez, onze, doze, defendeste a dinastia
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